
O Plenário do Senado aprovou, nesta quarta-feira (28), o parecer favorável do senador Sérgio Moro (União-PR) ao Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 717/2024, de autoria do senador Esperidião Amin (PP-SC), que susta atos do Poder Executivo relacionados à demarcação de terras indígenas em Santa Catarina.
A proposta anula o artigo 2º do Decreto nº 1.775, de 8 de janeiro de 1996, que trata do procedimento istrativo de demarcação de terras indígenas. Também estão na mira do PDL os Decretos nº 12.289 e 12.290, ambos de 4 de dezembro de 2024, que homologaram, respectivamente, a demarcação das terras indígenas Toldo Imbu, no município de Abelardo Luz, e Morro dos Cavalos, em Palhoça.
De acordo com a justificativa apresentada, a Lei nº 14.701, de 20 de outubro de 2023, que trata do Marco Temporal, alterou as regras para demarcação de terras, impondo maior transparência e exigindo adequação dos procedimentos à nova legislação.
O autor do projeto, senador Esperidião Amin (PP-SC), argumentou que os decretos editados no início de dezembro pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva não seguem as determinações da nova lei. Ele destacou ainda que muitas das áreas envolvidas são ocupadas por famílias com títulos de propriedade legítimos. “Tenho a noção perfeita da grande responsabilidade que nós enfrentamos”, afirmou Amin.
Na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), nesta quarta-feira, o relator da matéria, senador Alessandro Vieira (MDB-SE), havia reconhecido a constitucionalidade da sustação apenas do artigo 2º do Decreto nº 1.775/1996, mas considerou inconstitucional a tentativa de sustar os decretos de homologação, por tratarem-se de atos istrativos concretos. Moro discordou e apresentou voto em separado, que acabou prevalecendo.
Segundo o parlamentar paranaense, excluir os decretos de homologação do alcance do Congresso é uma visão “excessivamente restritiva e formalista”. “Não resta dúvidas de que os decretos de homologação nº 12.289 e 12.290, de 2024, foram editados com base em procedimento incompatível com a nova legislação. São atos dependentes de um regulamento ilegal e que exorbitam dos limites fixados pelo Legislativo”, afirmou Moro.
Ele argumenta que, apesar de revestidos de aparência concreta, os decretos têm efeitos normativos profundos. “São atos de impacto estrutural, que transformam o regime jurídico de propriedades centenárias, criam instabilidade fundiária, acirram tensões sociais e ignoram o direito à segurança jurídica de comunidades que há décadas ocupam pacificamente esses territórios.”
Para Moro, o Congresso tem o dever de agir diante de abusos do Executivo, mesmo quando formalmente apresentados como atos concretos. “Trata-se, em essência, de um debate sobre a natureza e os limites das funções constitucionais do Poder Legislativo. O controle do Congresso não pode estar à forma do ato, mas sim ao seu conteúdo, à sua função e aos seus efeitos jurídicos e sociais.”
O senador Zequinha Marinho (Podemos-PA), também durante a discussão na CCJ, argumentou que a política de ampliação de terras indígenas está descolada da realidade atual da população indígena, especialmente entre os jovens. “Temos os mais velhos por lá, mas a geração mais nova está em busca de oportunidades. Temos 119 milhões de hectares para 0,5% da população brasileira. Criar uma área indígena é uma coisa que impacta economicamente o estado e o município. Aí, se cria por decreto e no dia seguinte se têm famílias impactadas”, disse Zequinha.
Moro também citou precedentes para justificar a sustação de atos istrativos com efeitos concretos, como o Decreto Legislativo nº 293/2015, que anulou portaria interministerial com impacto direto sobre o pagamento do seguro-defeso a pescadores artesanais, e o PDL nº 206/2023, que sustou decreto presidencial sobre a exigência de vistos para turistas de países específicos. “O controle por decreto legislativo é um instrumento legítimo de freios e contrapesos, uma reação política e constitucional à tentativa do Executivo de reconfigurar o ordenamento jurídico por meios infralegais.”
Ele concluiu com um alerta sobre o risco da omissão do Parlamento. “Se o Congresso não zelar pelo respeito às leis que aprova, perderá progressivamente sua autoridade e credibilidade, tornando-se uma mera casa consultiva, um enfeite decorativo em um regime que nada terá de democrático.”
O texto agora segue para a Câmara dos Deputados, onde será apreciado.
Informações: FPA